sexta-feira, 17 de novembro de 2017

SOLIDARIEDADE


                                       
                                                         
  Os pés cansavam sempre mais. Não sabia ele por quanto tempo poderia ainda caminhar. À sombra de uma árvore, observava os arranha-céus e se lembrava dos tempos em que a grande maioria das casas tinham varandas aconchegantes, diferentemente de hoje, em que os espaços deram lugar a muros altos e grades de ferro, pois as pessoas precisam se proteger.
  Após alguns minutos de contemplação continua o andarilho a sua caminhada, banhado pelo suor e em desarmonia com seus próprios passos. Carrega um carrinho com algumas bugigangas sendo, em sua maioria, papéis e caixas de papelão que recolhe em lugares diversificados para vendê-los. É o seu sustentáculo.
  Chega o fim do dia e o pobre homem, desprovido pela sorte, quase nada conseguiu. O dia fora improdutivo e suas pretensões de ganhar um pouco mais para o sustento começavam a desvanecer-se.
  O crepúsculo vespertino despontava trazendo um lânguido e suave enternecer. Logo seria noite e, mais uma vez, muitas perguntas lhe vinham à mente: - “o que teria feito de tão condenável para merecer viver assim?” – indagava de si para si olhando as fachadas das casas e as portas do comércio já se fechando. Vez por outra pensava em desistir da vida, mas lembrava-se das lições que recebera dos pais para nunca desistir, por maiores que fossem os obstáculos e adversidades, os quais, existem justamente para serem transportados e que o sofrimento depura a alma.
  Caminhando um pouco mais, eis que, de repente, presencia um acidente. Um motorista alcoolizado atropela uma senhora idosa e a deixa caída no asfalto, fugindo em seguida, sem prestar socorro. Imediatamente, o catador de papel vai ao encontro da mulher ferida, observa que ela está viva e faz menção para que os motoristas e transeuntes parem o tráfego e implora para que chamem o socorro médico. A sua aflição e solidariedade era tanta que, ao correr em direção à vítima, não se lembrou de ter deixado o seu carrinho um pouco distante do lugar devido, e outro veículo que passava atingiu, em cheio, o seu único instrumento de trabalho.
  O homem não se desesperava, mas não poderia deixar de preocupar-se  e pensava: - “E agora, o que fazer?”.- Entretanto, o que mais lhe importava naquele momento era ver a velha senhora recuperar-se do susto e dos ferimentos.
  Alguns minutos depois, chegou a ambulância. Foram prestados os primeiros socorros e a mulher foi levada ao hospital, sem antes perguntar com esforço o nome do pobre homem que, prontamente, providenciou para que ela fosse retirada dali com vida e medicada. E assim, indagou: -
  - Qual é o seu nome? –
  - Chamo-me Felisberto. E a senhora?
  - Florinda.
  Dizendo isso, imediatamente a vítima foi colocada na ambulância e partiu com destino ao hospital.
 Logo ao chegar, foi reconhecida por um amigo a quem ela pediu que procurasse o tal de Felisberto e o ajudasse no que fosse possível. Esse amigo fez comunicou à família sobre o ocorrido e procurou Felisberto no local do acidente. Ele ainda estava ali pensando no que fazer, ao lado carrinho que teve uma das rodas arrancadas.
  Esse amigo aproximou-se no afã de ajudar e, para maior surpresa de Felisberto, o rapaz era filho de um rico fabricante de papelão, proprietário da própria fábrica para onde se destinava todos os materiais que ele recolhia na sua triste rotina.
  Felisberto foi admitido na fábrica e sua vida se transformou como um milagre igual àqueles que ele nunca deixou de acreditar. Para ele, foi uma resposta divina. E fica a lição: as sementes de benevolência que disseminamos poderão se perder, mas se uma só brotar perfumará nosso caminho por toda a eternidade.

Autoria:  Antenor Rosalino

Imagem da internet